terça-feira, 4 de outubro de 2011

Brinquedos Financeiros


 
Em nome da transparência pública, os Relatórios e Contas dos mais diversos organismos são agora colocados on-line, disponíveis a toda a comunidade. Infelizmente, quanto muito, a maioria dos leitores contenta-se com os sumários executivos, remetendo as tabelas técnicas ao esquecimento, no baú dos seus direitos democráticos. Mas existem autênticas pérolas redigidas em alguns destes documentos que não deveriam escapar ao cidadão atento à luz do dia.
Por exemplo, no último Relatório e Contas do Metro do Porto (2010) e no que diz respeito aos instrumentos financeiros derivados cito o seguinte: “não existe informação disponível, dada a complexidade (…) das estruturas presentes na carteira de derivados, facto que apenas possibilita uma avaliação em termos meramente descritivos”. 
No contexto da cratera financeira actual, é bastante reconfortante saber que uma conta desta natureza nem quantificável é!
Um pequeno esclarecimento: não falo da dívida "formal". Estas contas "escondidas" acrescentam ao valor total final da dívida portuguesa, mas estranhamente ninguém fala desta. Estes instrumentos financeiros em causa derivam o seu valor a partir do valor de um outro elemento financeiro de forma a reduzir ou anular o risco da variação do preço de determinado activo – matérias-primas, acções, obrigações, taxas de juro/câmbio ou índices. Um “benefício” destes instrumentos, é a sua função como crédito sob disfarce, escapando assim às normas de contabilidade mas expondo o organismo a uma alavancagem financeira altamente especulativa.
Mas a dívida oculta não era só na Madeira? Nada mais errado. De facto somos amadores quando comparados com os profissionais de brinquedos financeiros. Olhemos para além dos valores da dívida directa e oficial.
Após as eleições legislativas nacionais deste ano, foi emitido um despacho da Secretaria de Estado do Tesouro e Finanças (Despacho nº 896/2011-SETF) determinando o envio de informação detalhada sobre os Instrumentos de Gestão do Risco Financeiro (IGRF) actualmente contratados pelo Sector Empresarial do Estado (SEE). 
O Relatório do SEE 2011 (Direcção-Geral do Tesouro e Finanças) salienta que mais de 60% destas operações são contratadas com bancos de origem estrangeira e numa análise de sensibilidade à variação das taxas de juro estas empresas públicas apresentam um passivo de operações de derivados na ordem de 1.549.685.000 euros (swaps calculadas em valor Market-to-market). Mais de mil milhões e meio de euros em passivo do sector empresarial do Estado português, com especial incidência na área dos transportes pois os maiores prevaricadores são o Metro do Porto (625.485.000) e o Metro de Lisboa (520.304.000), organismos que não beneficiam a totalidade do território português.
Neste contexto é evidente que o ataque às opções políticas na Madeira é desproporcional no que diz respeito às estratégias financeiras do passado. Num mar de acusações acumula-se muita desinformação, mas o maior iceberg vem sempre à luz do dia. 
 RB

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